Campo Grande (MS) – São mais de 15 animais mortos a cada segundo nas estradas brasileiras, cerca de 1,3 milhão por dia e até 475 milhões de animais por ano no Brasil, segundo dados do Centro Brasileiro de Estudos em Ecologia de Estradas (CBEE). Preocupados com isso pesquisadores do Centro de Estudos em Meio Ambiente e Áreas Protegidas (Cemap) da Universidade Estadual de Mata Grosso do Sul (Uems) – unidades de Aquidauana e Campo Grande -, em parceria com a Agência Estadual de Gestão de Empreendimentos (Agesul), executam o projeto: Estrada Viva: A Fauna Pede Passagem.
Projeto em que são monitorados os atropelamentos de animais silvestres na BR 359, que interliga o município de Coxim (MS) a Mineiros (Goiás), onde são encontrados, quinzenalmente, um índice de 22 animais mortos, sendo os mais identificados: tamanduá, lobinho, tatu e anta.
Os resultados obtidos, em 29 campanhas de monitoramento, somam cerca de 653 animais atropelados. Observações de campo constataram ainda que a maior incidência de atropelamento se deu em áreas próximas a córregos em fundo de vales, locais com maior concentração de vegetação e de modo continuo, e mesmo próximas a regiões de grande ocorrência de cupinzeiros.
Para o coordenador do Estrada Viva, o professor da Uems, Afrânio Soriano, o Projeto é uma proposta para o estabelecimento de um protocolo de ações para as estradas de Mato Grosso do Sul na prevenção e mitigação de impactos. A ideia é subsidiar a elaboração de uma política pública para que o Governo do Estado, por meio da Agesul, possa implantar um programa permanente, junto às estradas do MS como um todo. Deste modo a perspectiva de se constituir um fórum, reunindo universidades, ONGs, promotores públicos, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (Imasul) para dividir responsabilidades e pactuar soluções concretas e viáveis para prevenção e mitigação acidentes com animais nas estradas”.
O professor ainda ressalta que o Estado, por meio da Agesul, está assumindo um papel protagonista neste caso e que a Uems é parceira, “pois não é possível mais admitir essa ‘catástrofe’ que vemos diariamente em nossas estradas”. O projeto de monitoramento é apenas a primeira fase (diagnóstico), mas com base neste já é possível promover algumas intervenções (segunda fase) como estabelecimento de sinalização educativa e de advertência, redutores de velocidades, campanhas de educação ambiental com usuários e comunidade, colocação de cercas em passagens de fauna, e levantamento de fauna silvestre para definição de risco potencial, etc.
O diretor de Meio Ambiente e Segurança do Trabalho da Agesul, Pedro Celso de Oliveira Fernandes, destaca que é a primeira vez que a Agência está fazendo este trabalho com qualidade técnica. “Vai melhorar muito a qualidade, com mais segurança para os usuários e a proteção da própria fauna. Tudo começou com uma demanda jurídica, com exigência do Imasul para monitoramento da fauna”.
Ele ainda observa que a parceria com a Uems é um benefício que atingirá diretamente a população. “É benefício para todos os envolvidos: os alunos e professores podem participar de atividade práticas; a Secretaria de Infraestrutura; e diretamente o cidadão que será beneficiado com mais segurança de tráfico, com custo muito reduzido”.
De acordo com o estudo, os fragmentos de vegetação e o tráfego de veículos foram, provavelmente, os fatores que mais contribuíram para esse índice de mortes. “Neste percurso, de Alcinópolis (MS) a Mineiros (GO), há mais áreas agrícolas, tráfego de veículos pesados e pouca circulação de veículos leves”, mostram as análises.
Quanto à composição da fauna atropelada tem se caracterizado pela ocorrência de Canídeos (como o lobo) e outros animais de pequeno porte atropelados. A ocorrência de pássaros atropelados no percurso de Coxim à Alcinópolis foi expressiva devido à presença de espécies da flora que são fontes de alimentos para estes, em especial para Psitacídeos (papagaios, periquitos, araras).
Os atropelamentos de grandes mamíferos, como a anta, foram registrados próximos ao Parque Nacional das Emas (em áreas de corredores, junto a fragmentos isolados de ambos os lados da pista e próximo a córregos). “A rodovia, nesse percurso, não possui sinalização e nem redutores de velocidade, sendo que os veículos pesados trafegam em alta velocidade e como muitos transportam grãos, invariavelmente, deixam cair alguns grãos que acabam por atrair animais para a rodovia”, revela o documento.
Segundo o coordenador do projeto, com os dados existentes já seria possível iniciar a segunda fase, principalmente, para identificar e localizar as grandes populações de risco e estabelecer um plano de manejo/contingencial, “queremos pesquisar novos métodos utilizando VANTs [Veículos Aéreos Não Tripulados) e sensores térmicos”, acrescenta.
“Queremos propor uma maneira de compatibilizar a área de vida dos animais silvestres e a produção agrícola. A população da fauna está diminuindo e a estrada acaba sendo um fator muito antrópico, de muita interferência para a população silvestre. Estradas se não forem bem manejadas no ponto de vista da fauna, são fontes de morte, tanto para os seres humanos, por conta do perigo de acidentes, como para os animais”, ressalta.
Uma importante conquista obtida recentemente – neste mês -, embora de modo indireto, foi a aprovação da construção do Centro de Triagem e Reabilitação de Animais Silvestres de Mineiros, que será o terceiro do estado de Goiás e que segundo seu idealizador, o engenheiro florestal, André Luiz de Oliveira, da Secretaria de Meio Ambiente de Mineiros, os dados do monitoramento foram um dos principais fatores para a aprovação do Projeto.
Todas as informações obtidas nas campanhas/levantamentos, como espécie, localização geográfica, tamanho e sexo estão sendo adicionados a um banco de dados (planilha adaptada do SISBio) para análise estatística com o programa Siriema (Nerf – Núcleo de Ecologia de Rodovias e Ferrovias da URGS). Também estão sendo confeccionados mapas de distribuição de atropelamentos e ocorrência de fragmentos florestais, entre outros elementos de interesse com o emprego do programa ArcGis. A equipe do Gemap/Cemap conta com um veterinário, um ajudante, dois alunos bolsistas (Pibex e PiBIQ) e colaboradores voluntários.
Eduarda Rosa – Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (Uems)